Enquanto juristas e cientistas políticos discutiam exaustivamente a crise política e moral por que passa o Distrito Federal, 2,5 mil supostos retirantes invadiam uma área de proteção ambiental de 200 hectares (2 milhões de metros quadrados) nos fundos do Itapoã, uma cidade nascida de uma invasão que deu muitos votos a políticos e enriqueceu um grupo de grileiros na Capital da República.
A invasão principiou no dia 12, em pleno carnaval e quando o governador José Roberto Arruda já havia sido preso e afastado do Governo do Distrito Federal. Destruíram a vegetação e nascentes, invadiram áreas pública e privada, incendiaram o cerrado sem dó nem piedade.
Por trás do movimento, interesses da especulação imobiliária e políticos, fomentados por grileiros e cabos eleitorais em busca do lucro e currais para as eleições que se aproximam. Cerca de 84 veículos de luxo foram filmados pela Inteligência da Secretaria de Segurança e da Polícia Civil do DF dando apoio aos invasores.
Governador preso, vice-governador na corda bamba, tudo indicava que o campo era fértil para toda sorte de malefícios – da simples esperteza ao crime mais hediondo -, mas foi aí que a súcia delinqüente se enganou. No meio deles, 14 criminosos com antecedentes de assalto a mão armada, tráfico de drogas e homicídio doloso qualificado.
As instituições permanentes do Estado demonstraram um grande poder de resposta e coesão, agindo de forma articulada, com estratégia e tática, comandos unificados e uma disposição incrível de acertar, sem os ciúmes incompreensíveis que se demonstram no dia a dia das corporações.
Delegados e agentes, oficiais e praças, servidores dos órgãos de fiscalização, engenheiros e técnicos ambientais, todos se uniram em defesa do patrimônio público e do meio ambiente. Resultado: 41 grileiros presos por dano ao meio ambiente e ocupação irregular do solo, além de invasão a terras públicas, com penas que chegam a oito anos de reclusão, e 22 detidos por crime de pequeno potencial ofensivo, esbulho possessório, cuja pena é de até um ano de detenção.
No momento em que se apregoa a existência de uma metástase no organismo de poder do Distrito Federal, as instituições permanentes demonstram que, independentemente de governos, podem funcionar normalmente em defesa da sociedade, bastando para isso que o comando seja profissional, técnico e imparcial, sem a nefasta interferência da política partidária.
Miguel Lucena é Delegado-chefe da 6a Delegacia de Polícia Civil (Paranoá e Itapoã), no Distrito Federal