segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Novos Tempos

Há 22 anos, quando iniciamos o projeto do Disque-Denúncia, sinceramente não tínhamos a menor ideia do caminho a seguir. Não contávamos com informações confiáveis, qualitativas ou quantitativas. Precisávamos resolver nossos problemas de segurança pública através das informações da população e com as polícias de que dispúnhamos, explorando as narrativas dos mais experientes delegados e inspetores, verdadeiros arquivos de conhecimento policial. A situação do Rio era muito pior do que a de hoje, mas o que nos chama a atenção, de lá para cá, é a expressiva diferença existente entre o grau de complexidade com que agora precisamos lidar, comparada com a daquela época, complicada, é verdade, mas com soluções perfeitamente lógicas. 

Sistemas complexos sempre nos atormentaram, é claro. Em qualquer abordagem de uma situação criminosa nos aguarda a presença do imprevisível e do insperado. Mas hoje em dia a complexidade deixou de ser assunto referente a grandes eventos ou organizações, regiões metropolitanas, por exemplo. Prevenção, investigações e as próprias organizações policiais passaram a ser gerenciados a partir desta nova realidade, em função dos avanços da tecnologia de informação. Numa ocorrência de um sequestro em 1995, tivemos que procurar um Guia Rex de ruas do Rio, para localizarmos um endereço de cativeiro. Imaginem a diferença que faria contar com um moderno smartphone ou mesmo um laptop. Podemos afirmar com absoluta certeza que, em alguns anos, um cidadão não precisará dirigir-se a uma delegacia para registrar uma ocorrência, se é que existirão delegacias e batalhões. Organizações criminosas, antigamente isoladas em clãs são cada vez interligadas e interdependentes, o que significa que os crimes serão cada vez mais complexos.

Uma central de policia será (e, já é) muito mais difícil de administrar do que uma meramente complicada, como as de hoje. Sistemas complexos interagem de forma inesperada, o que os torna mais difícil de prever. As regras tradicionais de causa e efeito não funcionam como esperamos, pois o grau de complexidade pode estar além da nossa capacidade cognitiva. É mais difícil entender as coisas, fazer apostas, pois o conhecimento tradicional pode não prever o comportamento de um sistema complexo. E, se num sistema desses, o valor do fator atípico, o "outlier", pode ser muito mais importante do que a média, num sistema que envolva ação criminosa, então, será muito mais decisivo.

O que mais nos preocupa hoje em dia, é que, além das ferramentas analíticas existentes serem desconhecidas de estudiosos de investigação, ou, o que é pior, desprezadas, há uma carência imensa de executivos de polícia ou das academias que formam os gestores policiais de amanhã, que saibam lidar com elas. Minha experiência com inovações gerenciais indica haver uma primeira fase em que elas são rejeitadas como inoperantes, na segunda são aceitas como bruxaria e, finalmente, percebidas como progresso científico indispensável. Esta hoje é a grande questão: como trazer este conhecimento para o primeiro plano de nossas organizações policiais?

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